quinta-feira, 10 de outubro de 2013


Prejuízos e dor.

O cenário era de pós-guerra. Pedaços de asfalto soltos, fios expostos, placas retorcidas, lixo espalhado e árvores caídas. Foi assim que as cidades mais atingidas pela chuva torrencial da última terça-feira amanheceram, principalmente Ceilândia. Agora, a população contabiliza os prejuízos e busca forças para recomeçar.

Para a família de Giovana Moraes, 6 anos, o anoitecer de 8 de outubro ficou marcado pela tragédia. A menina, morta por afogamento, estava no ônibus que levava 23 crianças da escola para casa, em Ceilândia. Ele foi tomado pela água no viaduto da EQNN 5/7. “Quando eu fui até o ponto onde buscava as crianças todos os dias é que eu fiquei sabendo da tragédia. No próprio local eu já fui orientada a ir até o hospital”, relata a tia da criança, Eva da Conceição, 36 anos. Os filhos dela também estavam no ônibus. 

A menina teria ficado presa pelo cinto de segurança e foi necessário que um bombeiro mergulhasse para soltá-la. Ela foi levada para o Hospital Regional da Ceilândia (HRC), mas não resistiu. O laudo preliminar indica que a causa da morte foi derrame pleural, provocado pela água no pulmão.

Giovana morava na Chácara 84 do Condomínio Gênesis. Ela era a filha do meio de George da Silva e Maria Francisca. “Quando cheguei ao hospital, ela ainda estava viva, mas em estado grave”, contou, emocionado, o pai, que foi ao Instituto Médico Legal na tarde de ontem para a liberação do corpo. O enterro deve acontecer nesta manhã. 

Outras três meninas também levadas ao hospital já receberam alta. Uma quarta foi encaminhada ao Hospital de Base para uma avaliação neurológica, porque teria batido a cabeça, mas já voltou ao hospital da Ceilândia. A Secretaria de Saúde informou que o estado de saúde dela é bom e ela permanece estável.

O ônibus que levava as crianças foi contratado pela Secretaria de Educação há cerca de dois meses. O trajeto de Ceilândia Norte à Escola Classe 8, onde as crianças estudam, dura cerca de uma hora.

O alagamento do viaduto chamou a atenção para o acúmulo de lixo no local. A Administração de Ceilândia informou que a última limpeza foi feita há cerca de dois meses. Procurada, a Novacap prometeu fazer varredura para checar o que impediu a drenagem da água. 

Motorista será indiciado

Segundo a polícia, o motorista foi o primeiro a deixar o ônibus. Ele teria alegado, em depoimento, que foi buscar ajuda. No momento, Francisco Alves está internado, sob o efeito de calmantes. Assim que receber alta, o delegado vai indiciá-lo por homicídio culposo, quando não há a intenção de matar. 

José Raimundo, coordenador de Transportes da Secretaria de Educação, disse que questões como as condições do ônibus e quantidade de pessoas a bordo no momento do acidente estão sendo apuradas para verificar se houve falhas por parte da empresa contratada. E que as medidas cabíveis serão tomadas após o fim da investigação.

Dono da empresa de transportes Rodoeste, que levava as crianças, Adelino Medeiros afirma que os custos do enterro da menina serão cobertos pela empresa e que os esclarecimentos necessários já foram prestados à Secretaria de Educação.

Hora de consertar os estragos

Os estragos na DF-180, pista que liga Brasília a Brazlândia, já anunciavam o que se encontraria à frente. À beira da estrada, na região do Incra 9, moradores se uniram para consertar as casas destelhadas. Árvores caídas atingiram fios de alta tensão, o que fez parte da área ficar sem energia por mais de 12 horas. 

O pastor Leonardo Alves, 45 anos, conta que o muro e a placa colocada na fachada de sua igreja despencaram. “O problema maior dessa chuva foi o vento. Ele chegou forte, levando tudo. Graças a Deus não estava tendo culto na hora e ninguém se feriu”. O Centro de Ensino Fundamental Incra 8 ficou mais de 24 horas sem luz.

Alagamento

No Condomínio Gênesis, em Ceilândia, várias casas e lojas foram destelhadas e alagadas. No Supermercado Trem Bão, em uma das ruas comerciais mais movimentadas da região, a calha não resistiu ao volume de água e forçou o telhado, que quebrou. “Abrimos cedo para retirar a lama. A água vinha até o meio da perna, uma coisa horrível”, conta a gerente do estabelecimento, Miriam da Silva.

Famílias que tiveram suas casas completamente destruídas contaram com auxílio da Defesa Civil. “Montamos uma tenda para que essas pessoas possam ficar até terem condições de reparar os danos em seus imóveis. Foram doadas telhas, cestas básicas e colchões. Não houve feridos nos desabamentos”, disse o coronel Sérgio Bezerra, subsecretário de Operações da pasta.


Moradora de Ceilândia, a recepcionista Dayse Novaes, 28 anos, teve a casa destelhada e o muro da fachada derrubado pelo temporal. “Não tinha ninguém aqui na hora. Quando cheguei foi um choque, estava tudo destruído”, descreve.

As duas filhas dela estavam na casa ao lado, com a avó, Malvina Moreira, 43 anos. Ali o estrago foi maior. Parte da casa cedeu e a estrutura ficou comprometida, obrigando a dona de casa a ir para rua, na chuva, com as netas, para se proteger do desabamento. Ela diz que vai unir esforços para arrumar a casa e permanecer ali. “Fui alertada dos riscos pelos técnicos da Defesa Civil, mas infelizmente não tenho outro lugar para ficar”.

Sustos

Na altura da Chácara 84, do Sol Nascente, a situação não era diferente. O supervisor administrativo Leandro Pimental, 26 anos, perdeu a casa em que vivia com a mulher e uma filha. “Agora é recomeçar”, diz. Ruana Alves, 25 anos, vizinha dele, também teve a casa atingida. Ela não tinha para onde ir e passou a noite com o marido e os três filhos dentro do carro. “Somos do Maranhão e não temos família aqui".

No Condomínio Prive, em Ceilândia, uma árvore caiu em cima de uma casa, destruindo um cômodo. Com isso, a família de Hemilly Ranoick, 23 anos, não pôde ficar no local. Ela conta que encaminha pedidos para a poda da árvore à administração regional desde 2010 e que a Novacap chegou a visitar o terreno, mas só cortou os galhos maiores. “Com o impacto, caiu um pedaço do muro nas costas e na perna do meu irmão. Ele só teve ferimentos leves”, conta. 

Vulnerabilidade

Além das 14 casas completamente destruídas, outras 66 foram destelhadas no Sol Nascente. De acordo com a Defesa Civil, os pontos onde tiveram as ocorrências são áreas de risco, onde 320 pessoas foram afetadas. “Já emitimos vários alertas em relação ao Sol Nascente durante todo o ano, onde a gente informa as questões de vulnerabilidade e percepção de risco”, cita o coronel Sérgio Bezerra subsecretário de Operações da pasta.

Segundo o Inmet, as chuvas devem continuar hoje e amanhã. Hoje, pode ocorrer nevoeiro pela manhã e chuva à tarde. Por conta disso, o coronel Bezerra faz algumas recomendações. “Se a casa estiver sendo inundada, deve-se tirar, primeiramente, as crianças, idosos e pessoas com dificuldade de locomoção. Desligue o disjuntor para evitar curtos e choque elétrico. Caso tenha destelhamento, abandonar o local e procurar abrigo. A prioridade é a proteção das próprias vidas, só depois de passar o perigo é que é aconselhável retornar para pegar pertences”, alerta Bezerra.

Perdas

A dona de casa Maria da Glória dos Santos, 55 anos, teve o subsolo da casa onde mora totalmente alagado e perdeu móveis, roupas e documentos, mas se consola ao pensar que a tragédia poderia ter sido ainda maior, se todos em casa estivessem dormindo.

E se em casa o medo é de desabamento, na rua o receio é de alagamento. Em dias de chuva, Patrícia Lopes, 24 anos, mãe de Daniel e Ticiane, diz ter medo de passar próximo ao viaduto onde ocorreu o incidente com o ônibus escolar. Esse lugar é um grande buraco”, diz.



Fonte: Jornal de Brasília


solnascentehoje.blogspot.com

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